por

Dell Xavier.

domingo, 15 de abril de 2012

Dor Elegante

Sabe, agora pensando, aquela sua camiseta verde musgo me caiu bem. Eu me divertia brincando de realizar o que sempre sonhei e você parecendo saber disso, sorria de lado. 
Você sabia também que precisava dormir. Precisava ir embora, sem regresso. Mas ninguém lembrou disso no instante em que o dia amanhecia e você fumava um cigarro olhando no parapeito da janela os riscos de chuva que caiam e não molhavam ali, evaporavam antes, e eu me esforçava pra caber no espaço que restava entre você, o baobá, a pena, o cigarro, a janela e a minha liberdade, que você levou, não por assalto, como o de mais cedo, mas porque ela quis ir embora contigo naquele momento em que se tornou independente. 
Sabe, pensando ainda, talvez eu tenha passado todos esses anos esperando 'el navi nel porto' e agora 'mille speranze che un giorno, mi ritroverai'. 
Ainda não compreendo bem o tempo, às vezes fica mais claro, às vezes parece estar tudo dito, mas foi tão de repente. Assim como é Leminski: 'antigamente eu era eterno'. 
Quer saber, sem pensar, eu simplesmente desisti de esquecer.


[...]
um homem com uma dor 
é muito mais elegante 
caminha assim de lado 
como se chegasse atrasado 
andasse mais adiante 
carrega o peso da dor 
como se portasse medalhas 
uma coroa um milhão de dólares 
ou coisa que os valha 
ópios, édens, analgésicos 
não me toquem nessa dor 
ela é tudo que me sobra 
sofrer vai ser minha última obra."